A empolgação em torno do lançamento da série Senna da Netflix é mais do que justificada. Senna, a minissérie dramática e acelerada da Netflix, retrata Ayrton Senna, um dos maiores pilotos da história da Fórmula 1 e um herói em seu país natal, o Brasil. Mas a produção não é apenas para fãs de automobilismo. A história de vida do lendário piloto, pontuada por cenas de corrida eletrizantes, oferece ao público mundial a oportunidade de entender o homem por trás do mito, sua dedicação e perseverança. Nesta entrevista, a ARRI conversa com o diretor de fotografia da série, Azul Serra, ABC, sobre suas abordagens variadas para o projeto.

Diretor de fotografia Azul Serra ao lado da ALEXA 35
"Senna" é uma das produções mais ambiciosas da América Latina este ano. Você é do Brasil, onde Ayrton Senna é um herói nacional. Isso foi o que o atraiu para esse projeto?
Este projeto foi, de fato, uma experiência única na vida. Contar a história de um herói brasileiro que se tornou um dos atletas mais respeitados do mundo, foi tanto um desafio imenso, quanto um privilégio extraordinário. Eu cresci assistindo Senna correr todos os domingos. Lembro-me bem de ter testemunhado muitos momentos ao vivo que, 30 anos depois, estávamos recriando na ficção.
Lembro-me exatamente do dia do trágico acidente de Senna e de como fui a São Paulo para ver seu funeral, assim como um dos personagens da série faz. Foi como reviver minha própria experiência, colocando-me no lugar do personagem que estava filmando três décadas depois. Essa conexão emocional não foi só minha, ela contagiou toda a equipe.
Houve momentos no set em que os membros da equipe ficaram com lágrimas nos olhos ao assistir os monitores. O peso emocional de trazer essa história à vida era palpável.
Essa não foi apenas uma jornada cinematográfica, foi profundamente pessoal para muitos de nós. Ter a oportunidade de contar essa história dentro de uma produção que compreendia a importância de entregar excelência enquanto abraçava a inovação, foi um verdadeiro presente.

Uma foto entre várias cenas de corrida em “Senna”
A série cobre vários períodos. Que tipo de estética o diretor pediu? Como você traduziu essas ideias para o look geral da minissérie?
O showrunner e diretor Vicente Amorim imaginou uma série com uma linguagem cinematográfica clássica, onde a câmera nunca parasse de se mover. Embora a história se passe no passado, nunca tivemos a intenção de criar um visual “vintage”. Em vez disso, buscamos algo contemporâneo, ousado, hostil e reflexivo do ambiente de alta pressão da Fórmula 1. Cada decisão artística foi tomada para criar uma experiência visual imersiva. Esse foi nosso princípio que nos orientou.
Sabíamos que incorporaríamos imagens de arquivo dos anos 1980 e 1990, e usaríamos câmeras vintage seletivamente para adicionar textura realista. No entanto, o núcleo da nossa linguagem visual precisava ser poderoso, oferecendo ampla latitude, tons de pele naturais, cores vibrantes e contrastes marcantes. Embora o look evoluísse ao longo dos anos retratados na série, a imagem geral precisava permanecer consistente e coesa.

DF Azul Serra e a equipe buscaram criar “uma experiência visual imersiva”
O formato Super 35 continua muito popular. Por que ele se encaixou nesta história e sua escolha foi impulsionada tecnicamente pela narrativa?
Tivemos extensas discussões sobre profundidade de campo, que foi uma das principais razões para escolher o Super 35 em vez de grande formato. Embora apreciássemos as qualidades imersivas do grande formato, precisávamos de um controle mais preciso sobre a profundidade de campo. Algumas cenas exigiam que mergulhássemos no mundo interno de Senna, muitas vezes filmando com abertura máxima. No entanto, precisávamos equilibrar para garantir que a profundidade de campo não fosse tão rasa a ponto de perdermos o contexto espacial do fundo ou os detalhes meticulosos dos nossos cenários, criados pelo designer de produção Fred Pinto.
Outro fator foi a integração com efeitos visuais. Queríamos que o público apreciasse a complexidade e o detalhe das cenas sem perceber diretamente os efeitos visuais.
No fim, escolher a ARRI ALEXA 35 pareceu a escolha perfeita, e foi absolutamente confiável. Na época, o novo sensor da ARRI tinha acabado de ser lançado, e eu já o havia testado extensivamente em outros projetos. Ele entregou exatamente o que precisávamos: um amplo alcance dinâmico, controle preciso e o impacto estético necessário para dar vida à história.
Que câmeras vocês escolheram para trabalhar e por quê?
Dividimos “Senna” em dois principais tipos de conteúdo: narrativa dramática e desempenho em corridas.
Para os segmentos dramáticos, filmamos inteiramente com a ARRI ALEXA 35, enquanto para as sequências de desempenho, focadas nas corridas, utilizamos outras câmeras.
Essa divisão foi intencional, pois os desafios técnicos e artísticos de cada uma eram muito distintos. Para as cenas dramáticas, que se concentravam nos personagens, contamos com a ALEXA 35. Sua latitude excepcional foi crucial, especialmente para as cenas dentro dos boxes, onde precisávamos equilibrar a intensa luz natural do lado de fora com o ambiente interno mais escuro. Além disso, para essas cenas, utilizamos uma variedade de lentes teleobjetivas e diversos zooms, incluindo a Signature Zoom 65-300 mm, tornando o formato Super 35 da ALEXA 35 a escolha perfeita.

Foto da série da Netflix “Senna”
Entendemos que “Senna” foi visualmente dividido em quatro fases distintas, cada uma representada por uma paleta de cores única. Você pode elaborar sobre essas fases e como conseguiu os tons e texturas específicos de cada uma?
Criar um arco visual foi essencial para nós. A história de Senna se estende dos anos 60 aos anos 90, um período marcado por mudanças tecnológicas significativas na comunicação, tipos de filme, transmissões de TV e dispositivos. Para refletir isso, dividimos a série em quatro fases principais:
Fase 1: Infância e Brasil. Representa a casa de Senna, um lugar quente e vibrante, cheio de vida. Utilizamos cores ricas e quentes para trazer a atmosfera brasileira. As lentes eram mais angulares e próximas aos personagens, enfatizando a intimidade e o movimento.

A história de Senna começa nos anos 60, um período que influenciou a paleta visual da série
Fase 2: Reino Unido – Os Anos de Solidão. Durante esse período, Senna estava isolado, tentando provar seu valor em uma terra estrangeira. Ainda usamos lentes angulares, mas o enquadramento se afastou, isolando-o dentro das composições para enfatizar sua solidão. A paleta de cores era mais fria, mas mantivemos a vibração dos carros e dos uniformes das equipes para manter o contraste vivo.
Fase 3: Fórmula 1 – A Hostilidade Vibrante. Esta fase mostra o espetáculo da F1: um ambiente visualmente estimulante e cheio de energia. As cores, texturas e iluminação foram todas projetadas para refletir a vibração desse mundo. Nossa colorista, Luisa Cavanagh, assumiu uma tarefa monumental na correção de cores, garantindo autenticidade. Os brancos tinham que ser brancos verdadeiros, o vermelho da Ferrari era distinto dos tons fluorescentes da McLaren, e o icônico capacete amarelo de Senna era perfeitamente consistente. Utilizamos lentes teleobjetivas combinadas com movimento constante da câmera para criar uma sensação onipresente de dinamismo.
Fase 4: Imola – O Capítulo Final. Nesta fase, Senna faz a transição de seu icônico McLaren vermelho e branco para o Williams azul e branco. A própria Fórmula 1 começa a se modernizar, com boxes mais limpos e espaçosos. Para refletir essa transformação e os últimos dias de Senna, criamos um visual etéreo, quase sobrenatural, com uma paleta pálida e gelada. A imagem se tornou mais misteriosa e reflexiva, espelhando o peso emocional deste capítulo.
Através dessas fases visuais cuidadosamente elaboradas, buscamos honrar a jornada de Senna e os marcos emocionais que definiram sua vida extraordinária.
Há muitas coisas que impactam as cores e temperaturas em “Senna”, desde o clima até as diferenças de temperatura da luz ambiente entre o Brasil e Londres, por exemplo. Você notou ainda mais diferenças nos tons de pele? Como lidou com isso?
Este foi um projeto extenso de correção de cores. Tivemos uma fase de preparação muito detalhada, durante a qual realizamos muitos testes para chegar ao set o mais preparados possível. Nossa colorista, Luisa Cavanagh, esteve profundamente envolvida em todas as etapas do projeto, não apenas no final, como é costume. Ela e nosso DIT, Binho Tashiro, estavam em constante comunicação para garantir que tudo permanecesse no caminho certo.

Equipamento de iluminação da ARRI também foi usado no set de “Senna”
Como você abordou as filmagens nas difíceis condições climáticas?
Isso foi definitivamente a parte desafiadora. Filmamos extensivamente em Balcarce, uma pequena cidade no interior da Argentina, onde enfrentamos temperaturas extremamente baixas, ventos fortes, neblina e chuva. Um cronograma flexível foi essencial, permitindo-nos adaptar nossos planos de filmagem de acordo com as corridas. Filmamos muitas das sequências de corrida na chuva, e a cabeça remota SRH‑360 da ARRI foi crucial para nos permitir filmar em todas as condições possíveis.
Na pós-produção, como Luisa Cavanagh, sua colorista, se sentiu em relação ao novo processo de imagem ARRI LogC4? Com tantos efeitos visuais, você ficou satisfeito com o processo e os resultados?
Sim, ficamos impressionados com os resultados. Luisa afirmou claramente: “A imagem que alcançamos usando o LogC4 da ARRI foi impressionante. Acho que, particularmente para tons de pele, há muito mais informação de cor. A resposta em diferentes contextos e condições fornece detalhes mais sutis nas cores.”
O que você tem planejado a seguir? Ou está tirando um merecido descanso?
Terminamos “Senna” no final de 2023, e 2024 também foi um ano cheio, mas muito especial. Filmei dois longas-metragens e uma série de TV britânica chamada “Atomic”. Agora é hora de descansar e me preparar para os próximos desafios.
“Senna” já está disponível na Netflix.

“Este projeto foi realmente uma experiência única na vida” – DF Azul Serra, ABC
Imagem de abertura: © Netflix